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segunda-feira, 16 de julho de 2012

Era pra ser uma dedicatória...


Eis porque cantar


Você foi embora, e eu fiquei
A pensar na vida…

Naveguei águas profundas
Encontrei peixes grandes

Fui longe…
Pesquei-pensei peixe grande assim:

(Conversei)
- O que há de ser de mim, se nada der certo?
E se tudo não mudar?
Se o Homem, afinal, nunca for amigo do Homem, o que responderemos a Bertolt Bretch?
Como dizer ao velho que nunca seremos parceiros, uns dos outros?
Que nunca saberemos preparar o terreno pro amor?
Que a dor e a injustiça é que vão, no fim, vencer?
E que, "Aos que vão nascer", é um poema fadado a ser eternamente repetido, geração após geração, como uma maldição que venceu o tempo?

(Citando Bretch)
- "Vocês, que emergirão do dilúvio
Em que afundamos
Pensem
Quando falarem de nossas fraquezas
Também nos tempos negros
De que escaparam.
Andávamos então, trocando de países como de sandálias
Através das lutas de classes, desesperados
Quando havia só injustiça e nenhuma revolta.

Entretanto sabemos:
Também o ódio à baixeza
Deforma as feições.
Também a ira pela injustiça
Torna a voz rouca. Ah, e nós
Que queríamos preparar o chão para o amor
Não pudemos nós mesmos ser amigos.

Mas vocês, quando chegar o momento
Do homem ser parceiro do homem
Pensem em nós
Com simpatia."

- Ah, Bretch, meu velho, o que será feito de nós?
Se perdermos o momento e fracassarmos?
Não o olharemos com simpatia,
Olharemos com vergonha...

- São negros os tempos, ainda.
E nossas vozes, roucas,
Ainda o são:
Poucas e roucas…

- Se assim for, por Deus,
O que há de ser de mim? De nós?
Onde guardar a dor de uma existência sem esperança?
Haverá vida sem esperança?
Como sobreviver à derrocada da vida pela escuridão?
Continuaríamos em frente se achássemos que não tem porquê?
Não seria, justamente essa, a única (des)razão suficiente para darmos cabo de tudo de uma vez?!

- Eu não sei, não sei responder…
E não sei, porque já não sei mais viver sem esperança.

- Então, é por isso,
Que insistes em cantar,
Trovador?

- Em que mares foi que navegou?

- Em que mares foi,
Que o fizeram assim:
De tal maneira insano, de tal maneira belo, de tal maneira torpe,
A seguir por aí, sempre a cantar?

- Em que mares foi, trovador?
Em que longínquo Oceano venceste o medo que, ainda hoje, me arrebata só de pensar?

- Minhas palavras não chegam a explicar o que meus olhos (ainda) não vêem.
Mas meu corpo não nega, e sente, cada vez mais, e melhor:

- Há porque cantar.

(Cantei)
"Meu coração não se cansa de ter esperança de um dia ser tudo que quer…
(…) Meu coração vagabundo já guardou o mundo em mim…"

- E agora, como faz?

- Ora, ele que me entenda, o mundo!
Que se guarde também,
Em si, por si…
Como eu guardei.
E resguardei,
E respirei…

- Que o mundo se molhe,
Se banhe, se lave,
Se ame...
Que o mundo se limpe, se entregue
Se abra,
Que cante!

- Que o mundo flutue, transcenda,
Entenda, e melhore…

(Todos)
- Que o mundo todo cante…

Todos os lás, e dós,
Maiores, menores,
De dores, amores

Que o mundo todo cante….

Todos os reis, (e nós!)
Mortais,
Todos os pois e tais,
Enfins e poréns,
Afins e que-nens,
Todas as palavras…

Todas as vozes, canções,
Continentes, nações,
Grafites nas ruas,
Amarguras,
Poesias, orações,
Todas as idéias,
Os sonhos,
Aventuras,
E paixões…

Que o mundo todo cante...

Inimigos, amigos, irmãos,
Todas as mães e pais,
Os santos, os não…

Pecadores,
Judeus, hermitãos,
Corruptos, humildes,
Carentes cidadãos...

Cangaceiros,
Cachaceiros,
Criminosos
Sem perdão.

Políticos;
Toda sombra, toda luz
Todos os pés, todas as mãos...

Que o mundo todo cante!
Pra hoje, pra amanhã, pra ontem!

Pra vida…

Pra encher o vazio de existir
E secar o pranto,
Que há de vir,
Sempre que, por acaso,
Vier…

Que o mundo todo cante…
O choro de toda mulher;
O choro da mãe sofrida,
E maltratada…

Que o mundo todo cante…
O choro do homem duro,
Combalido, exposto,
E desolado…

Que o mundo todo cante...
Pra ontem, pra agora, pra já!

Que o mundo todo cante a mesma voz…

Que cante, sim…
Porque essa gente do mundo todo,
Já faz é tempo, precisa só,
E nada mais,
Que de cantar…

Pra pensar,
Com compaixão,
Nos que, por aqui,
Como nós, agora estão,
E nos outros, que passaram,
Passarinho,
Ou passarão…

Por todos estes,
Que cantam juntos, aqui, agora,
No fundo do meu coração.

- Consegue ouvi-los?

Eis porque cantar.

14/07/2012

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