Pra de beleza não falar
Jurei, hoje, não falar de beleza.
Já que, mesmo aos pés da natureza
E bebendo dos rios agua fresca,
Fizemos um mundo que não presta.
Que só faz reforçar uma certeza:
De que onde há vida é na pureza,
Ou talvez num pequeno mar de pesca
Que ensine ao mundo não ter pressa.
Simplicidade sem alarde.
É velho o mar e eterno o rio.
Se vejo a face da cidade,
De tanto medo me arrepio.
Fujo dela sem notar,
Me perco nela sem parar.
De um lado dela eu vejo o mar
Do outro subo para o ar.
Tão grande o fluxo a circular,
Desperdiçado pelo chão.
Tão turvo o norte pra rumar
Que logo perco a direção.
De beleza não falar,
Jurei com o lápis já na mão
Que o sentimento que me dá,
Me vendo igual aos meus irmãos,
Dá um nó no peito de cegar
Os olhos do meu coração.
Nó cego, surdo e mudo.
Põe tantas vidas a trançar
Se emaranhando no escuro
Que vai fazendo apertar
O nó na garganta do mundo.
Nas gargantas que tentam falar,
Um silêncio moribundo.
Fazendo assim então calar
De tristeza a voz de um povo.
De um povo triste a se deitar
Todas as noites nesse chão.
Chão frio, duro, de matar,
Faz me perder em solidão.
De beleza não falar, e para tal me faço mudo.
Mas vejo aqui, sem me julgar,
Que talvez não desse pra focar
No belo, hoje, sobretudo.
Hoje é dia do lado de lá.
Dia de impor ao pé o chão.
Que a alma deve decolar,
Mas viver no ar não pode não.
Um tanto cá, um tanto lá.
Um tanto o ar, um tanto o chão.
Com menos pressa, vou em paz,
Que andamos rápido demais.
Nos perdendo de lá para cá,
Nos perdemos do que somos dentro,
Vagando, perdemos o lar,
Que se tem no presente momento.
Pra que a pressa, eu me pergunto.
Pra onde vamos com esse mundo?
Que tal um pouco de silêncio,
Que tal um mergulho mais profundo?
Nas agruras que temos no mundo,
Nos transtornos que temos na vida.
Na cidade que segue, varrida,
E confunde o que vemos de tudo.
Vai com calma cidade esquecida,
Que pelo caminho ficaram alguns.
Vai com calma cidade partida,
E não desperdice em vão mais nenhum!
Vou com calma por toda essa vida,
E me preparo pra vida que vêm.
Vou com calma agora na vida
Que a pressa já não me convém.
Vai com calma, cidade corrida
Que meu passo não tem tanta pressa,
Vai com calma, cidade perdida
Que o meu peito não entra mais nessa.
Vai com calma, cidade corrida!
Vem da alma a vontade que grita.
Vai com calma, cidade corrida!
Repete a voz que minha boca abriga.
Vai com calma, cidade corrida,
Com mais calma, cidade corrida...
Vai com calma e não deixe que em vão
De você se escorra a vida!
Nenhum comentário:
Postar um comentário