Aquarela: Isabel Svoboda
Meu sonho, no fim, anuncia
E eu já sabia, eu já sabia
No labirinto das linhas da mão
A vida esconde
Por onde, por onde?
O alarme, a seguir, interrompe
Velha mania. Já é dia, já é dia.
Em macabros-sonoros-fatos, me engole
Que fome, que fome!
Pro alarme, é mais um sonho que come
Sob o sono distraído dos homens
E nossa dor, que cantamos aos montes,
Quem ouvia, quem ouvia?
E nossa paz, que tesava os monges,
Quem sentia, quem sentia?
E nossas pernas, cansadas do fronte,
Quem trazia, quem trazia?
Heróis-mendigos-mutilados pelas ruas vagavam
Por Deus, de Deus, pra Deus, cantavam!
Como o velho infeliz da antiga rua
Mal sabia
Da voz-branca-flor que possuía
Mas quando a velha música ameaçava cansar
Roucas vozes, sombrias e urgentes, rapidamente grunhiam:
- Que vida! Que vida, que vida!
Garganta seca, rouquidão de quem não grita:
- Que vida! Que vida!
Mas cada uma, de súbito, morria
E quando tudo ao redor já se ia
É que um de nós levantava apressado e nos batia!
Mais alto, mais fundo, mais forte. Na face.
Nos lembrava e nos prendia:
- Teu nome, teu nome,
Teu nome, maria!
E vibrávamos! Milagre!
Quentes, juntos, jovens, tolos.
A esperança do amor em nós:
"Quem sabe um dia?!"
Certo dia cansamos
E quantas camas sujamos!
Quantas pernas dobradas de louça, trepadas com força
(E a maria, por onde andaria?)
Gozo ralo, nosso corpo fraco, meu suor em poça
Cansaço-falso-moralismo, cinismo, solidão
João se fazendo de macho, maria sem dó no coração
Mas a mão gulosa toca e leva, sem deixar.
Nessa triste história fria
De um joão e uma maria,
Aquarelas já choravam
Eu é que não via.